ELEIÇÕES E A FAZENDA QUE NÃO PODEREI VENDER - .

05 outubro 2021

ELEIÇÕES E A FAZENDA QUE NÃO PODEREI VENDER

Esta foto foi tirada logo na semana a seguir a ter concluído o meu curso e, sempre que a vejo, relembro o que o meu pai me disse na altura.

" Sofia, dei-te uma fazenda que não poderás vender"- disse-me ele.
Tenho quase a certeza que acenei afirmativamente, mas que não dei importância à frase. Afinal, eu tinha vinte e três anos, queria começar a trabalhar rapidamente para ganhar o meu dinheiro, ter alunos meus a quem ensinar e tinha a mania que eu sabia muito.
Não liguei à frase, repito, mas agora, a frase ocorre-me muitas vezes...O meu pai deu-me uma fazenda que eu não posso vender e, apesar de no contexto em que ele o disse se referir ao curso que eu acabara, eu, hoje, vejo que a fazenda teve mais a ver com exemplo de vida, com a vontade de ir e não deixar que a preguiça se instale, e com o facto de ser impensável para mim não ir votar...
Não imagino o meu pai a não ir votar e ele fê-lo até ao fim. Lembro a última vez, ele já em cadeira de rodas e eu a acompanhá-lo, eu a fazer a cruzinha no partido que ele pretendia, pois o facto de ele já não segurar bem a esferográfica poderia invalidar o voto. Tenho quase a certeza que não foi confortável para ele assumir esta fragilidade, mas impensável não cumprir o seu dever.
É por isso, também, que a abstenção me deixa triste- Como não manifestar a nossa intenção? Como ficar de fora de uma escolha que se deve fazer? Como não ser senhorio desse direito nosso, que une ricos e menos afortunados, baixos e altos, simpáticos e rabugentos? Como não usufruir dessa fazenda que é o nosso direito ao voto?
Estive ontem numa Mesa de Voto e confesso que não é algo que goste muito- eu tenho sempre receio de que algo corra mal, eram três boletins de voto e a responsabilidade que sinto põe-me nervosa. Mas sorri atrás da máscara e fiquei feliz por cada eleitor a quem disse o nome em voz alta- afinal, eles, ao contrário da maioria, tinham saído de casa e tinham ido votar. É assim que sinto estar a dar uso à maravilhosa fazenda que ele, homem com a quarta classe tirada na tropa, me deixou- a educação e os valores.
*Quanto aos resultados- correu muito bem. Agradeço a confiança a quem me convidou a integrar a lista do PS à Assembleia Municipal de Leiria, aos meus companheiros de lista da Maceira e de Leiria, aos que gostaram de me ver ser parte dela e aos que votaram.
Não vou mudar o mundo, mas ninguém duvide que darei o meu melhor. A fazenda que o meu pai me deixou não me permitiria outra coisa.

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