Os heróis moram na casa ao lado- O Senhor Zé - .

11 dezembro 2021

Os heróis moram na casa ao lado- O Senhor Zé


Há uns anos, numa reunião, uma colega verbalizou à frente dos que estavam que eu tinha a mania que era a Madre Teresa de Calcutá. Sei que engoli em seco, não respondi e pensei que afinal ela me conhecia muito mal, pois se soubesse como eu era, de que defeitos,  pensamentos e palavras  sou feita, não diria tal coisa. 

Adiante, pois este texto não é sobre mim, mas o parágrafo inicial serve apenas para contextualizar , pois há quem diga que  eu vejo tudo de um prisma demasiado positivo. Talvez sim, mas as redes socias são minhas. O blogue e a vida também.

Adiante de novo. Serve este post para vos falar do Sr. Zé.

O Sr. Zé é das pessoas mais importantes e respeitadas da minha escola e da minha freguesia. Ele conhece gerações inteiras de maceirenses, sabe do que ninguém sabe dos alunos, tira bolas de cima dos telhados, arranja o que está estragado, manda os meninos comerem a sopa e preocupa-se se eles comem pouco, está atento a quem é  estranho e se aproxima da escola, desinfeta mãos, cuida dos cães da escola com zelo e, só com um braço funcional, ajuda sempre quem mais aflito está.

Conhecemo-nos era ainda eu solteira e ele não era avô.  É uma figura de referência para os meus filhos, gosto muito de o ouvir e nunca esqueci o dia em que mudou o pneu furado do meu carro, enquanto eu olhava para ele embasbacada (e o carro não era pequeno).

- Deixe estar, professora Sofia. Eu mudo-lhe o pneu. Não me custa nada.


A foto  que ilustra este post tirei-lha eu faz hoje quinze dias. Sábado de manhã, passava eu em frente à escola para ir aviar as dezenas de medicamentos que a minha mãe toma e deparo-me com ele em frente ao portão. Parei o carro, falamos um bocadinho dos filhos e ele contou-me que estava  ali à espera de uma empresa que tinha de ir montar um novo frigorifico. À espera, de portão aberto, a ajudar a escola que é dele, sem nada receber em troca que não palavras de reconhecimento.

Despedi-me, entrei no carro e avancei. E fiz marcha-atrás.

- Posso tirar-lhe uma foto, Sr. Zé?

Acedeu (ele era lá homem para me negar um pedido) e  ela mostra como eu o vejo: um ser humano enorme que, vítima de acidentes e injustiças, nunca deixou que tal lhe o amargasse o sorriso ou afetasse o modo   de estar atento a quem dele precisa.

Digo muitas vezes isto aos alunos e já o devem ter lido por aqui- os heróis são sempre um bocadinho improváveis  e estão muitas vezes ao nosso lado. Assim é o Sr. Zé- um dos meus heróis, um homem discreto que não tem redes sociais, não sabe o que são seguidores no Facebook ou Instagram e, muito provavelmente, nunca lerá este meu post. *

* Não faz mal que não leia. Eu já lho disse e agradeci.



26 comentários:

  1. Que bom, Sofia. É também assim que o vejo. Sabes já saí da Escala há mais de dez anos e, na nova escola, continuo a dar comigo a pensar que bom seria poder contar com a colaboração preciosa de alguém como o Sr. José. Nunca lhe disse isto, mas talvez um dia. Bjs

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    1. Obrigada por leres.
      Eu digo-lhe que mandas um abraço:)
      Beijinhos, Rui. E saudades.

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  2. Estou com dificuldade em expressar o que senti quando li este teu texto porque as lágrimas não me deixam ver o que escrevo. Admiro muito o sr . Zé (entre nós é só Zé). Viu-me crescer mas eu também o vi crescer na escola e ganhar a sua posição, o seu lugar...o respeito que todos lhe têm.
    Era tão bom poder ter um sr. Zé em todas as escola!

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    1. Oh...Não sabia. Obrigada por leres.
      Beijinhos, querida Luciana!

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  3. Muito bonito. O senhor Zé faz parte da memória de muitos dos que passaram na escola da Maceira. Tenho a certeza que alguém lhe vai ler este post. Um merecido agradecimento.

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    1. Querida amiga, passaste aqui:)

      Mil beijinhos!

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  4. Pelos gestos se medem as mulheres e ainda bem que as há com manias. Adiante, adiante, pois o que importa é que haja um Senhor Zé nos locais mais improváveis da vida, sem pedir mais do que a dignidade a que todos os homens têm direito. São os verdadeiros heróis que salvam as portas dos fundos.
    Para as portas da frente há os poltões de plumagem fantasiosa do faz-de-conta que "não aquentam nem arrefentam".
    Bj.

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    1. Ensinas-me sempre tanto. Beijinhos, Agostinho.

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  5. Flávia Ramos11 dezembro, 2021

    Só consigo dizer uma coisa...Obrigada pela homenagem ao meu Zezinho, por sinal meu pai ������

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    1. Querida Flávia,
      E o orgulho com que ele me fala de ti.
      Beijinhos com saudades

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  6. Lembro me tão bem dele nos tempos que foi continuo, julgo eu um ano na escola da Batalha.. Depois disso sempre, que fui ao pavilhão desportivo da Maceira, lá estava ele sempre prestável

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  7. Obrigada sempre, sempre.
    Beijinhos, amigo!

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  8. Inês Coelho12 dezembro, 2021

    Como me lembro do Sr. Zé, e já saí dessa escola há 21 anos. Já ele trabalhava lá. Tudo de bom para si.
    Obrigado bjs

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  9. Engraçado que há relativamente pouco tempo estive a falar do Sr Zé ao meu filho...do ponto de vista do traquina da altura. Ainda nós rimos bastante à conta das inúmeras vezes q fiquei sem bola devido ao facto de estar a jogar em zonas proibidas ou que fui mandado pro fundo da fila do almoço por ter passado à frente. Cumprimentos, Luís Dionísio

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  10. Não tenho palavras para este texto tão lindo e verdadeiro sobre o nosso sr. Zé. Sem dúvida um dos seres humanos mais queridos que temos. Sempre pronto a ajudar, lindo demais o que escreveu. Beijinhos.

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