No domingo, fomos até São Pedro Moel, praia da minha infância e da do Luís ( que vinha de Viseu passar férias nessa vila). Quando regressávamos a casa, pela bonita estrada que vai dar à Vieira de Leiria, eu gritei: Pára o carro! Camarinhas!
Ao Luís, beirão, não lhe dizem muito as camarinhas, mas a mim...dizem muito, principalmente por causa da história que conto a seguir.
Só me lembro da minha mãe se ter zangado a sério comigo duas vezes. A última, deveria eu ter uns doze, treze anos. Sei que foi um dia em que a levei ao limite, em que eu não parava de lhe responder mal (e descarregar nela qualquer frustração minha, talvez). Não lembro o motivo, mas recordo como se fosse hoje, a minha mãe a chamar-me até à casa de banho, fechar a porta e, para não me magoar, rasgar em tiras o pijama que eu tinha vestido. Não me tocou no corpo, mas nunca esqueci o descontrolo e a tristeza que eu lhe vi nos olhos. Depois disso, devo ter melhorado por uns tempos, mas sei que na minha adolescência estive muito longe de ser uma filha fácil.
A outra vez em que a fiz desesperar, passou-se em São Pedro de Moel e eu deveria ter uns cinco anos. Sei que fomos os quatro (eu, a minha irmã e os meus pais) e que alugámos na praia uma barraca às riscas azuis e brancas que dava para o mar. Sei também que, à primeira oportunidade, me escapuli dos olhos deles e fui brincar para um escorrega vermelho que eu tinha visto mal entráramos na praia.
Recordo o friozinho da barriga que sentia de cada vez que subia as escadas do escorrega, que na altura me pareciam altíssimas, e me lançava por ali abaixo. Não sei quanto tempo estive por lá, sei que só me fartei quando avistei ao longe o Ti Batista, da aldeia vizinha, que passava por perto. Sei que me dirigi a ele e lhe disse que os meus pais também estavam na praia e que eu o poderia levar até eles.
Assim fiz. Cheguei contente e vi os meus pais e a minha irmã perto do mar, fui ter com eles a dar a novidade de quem eu encontrara e não percebi logo porque é que a minha mãe me levou até à barraca, fechou o pano para baixo, e me deu umas palmadas no rabo.
É que, durante todo o tempo que eu brincava no escorrega, eles procuravam-me, aflitos, no mar. Depois das palmadas, chorei baba e ranho, desconfio que não só da dor, mas da humilhação de ter sido repreendida ao pé do Ti Batista dos Mouratos. Sei que estava tão triste- naquela idade penso que não era capaz de perceber a aflição que atingiu os meus pais quando deixaram de me ver- e nem fui ao banho.
Para salvar o dia, valeram-me as camarinhas que comi, quando, depois da praia, parámos no Pinhal de Leiria. Brancas, gordinhas (são as mais doce), ali à mão de semear, a tirar-me o salgado não de mar, mas das lágrimas que ainda sentia.
Nunca mais esqueci as camarinhas e agora, sempre que as vejo e as como, misturam-se os sabores todos- doçura e amargo numa bolinha pequenina envolta em saudade.
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